Entrevista

Daniel Machado

Daniel Machado é geólogo formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tendo realizado intercâmbio na University of Colorado e uma pós-graduação em Engenharia Geotécnica.

Com experiência em geofísica e modelagem geológica 3D, Daniel se destaca na aplicação de técnicas indiretas para resolver problemas complexos. Possui conhecimento em mecânica de rochas, exploração mineral e programação, além de ter experiência com Inteligência Artificial. Atualmente, ele participa de projetos multidisciplinares colaborando com a integração de diferentes disciplinas.

A análise de estabilidade de cavidades (cavernas) tem se destacado como um tema importante na mineração. Quais ferramentas você considera indispensáveis nesse processo e qual a sua atuação no tema?

Muitas cavidades naturais são estruturas protegidas por regulação ambiental. Isso exige que mineradoras, por exemplo, assegurem que elas não sejam impactadas pelas operações de mina quando as atividades ocorrem próximo a elas. Nesse sentido, a aproximação da frente de lavra em relação à cavidade e aos desmontes de rocha, nos quais frequentemente são utilizados explosivos, são pontos de atenção. As vibrações geradas pelos desmontes devem ser controladas e monitoradas para que não causem vibrações que possam impactar as estruturas que não pertencem ao ambiente de mineração, incluindo as cavidades que mencionei.

Para que se possa realizar estudos consistentes no tema, torna-se necessário que tenhamos uma base de dados robusta sobre as cavidades bem como o histórico de monitoramento das vibrações e atividades associadas. A geometria das cavidades pode ser obtida com tecnologias baseadas em laser e a subsuperfície no seu entorno pode ser caracterizada por métodos geofísicos. Além disso, é importante que geólogos especializados façam o mapeamento litológico e estrutural do interior da cavidade sempre que possível. O monitoramento das vibrações é tradicionalmente feito por sismógrafos de engenharia. No entanto, a Tetra Tech é pioneira no Brasil na aplicação do monitoramento microssísmico, que pode trazer informações adicionais importantes como a variação de velocidade das ondas sísmicas no meio, que, por sua vez, se relaciona com o módulo de rigidez dos materiais em subsuperfície.

Com uma base de dados robusta, tudo é integrado em um ambiente computacional 3D. É a partir daqui que minha atuação é mais acentuada. Por meio de modelos tridimensionais podemos rodar simulações computacionais focando tanto na propagação das ondas sísmicas bem como nas análises de estabilidade. O estudo de fadiga dos materiais constituintes do meio, frente a vibrações constantes, é, inclusive, tema do meu mestrado. As simulações nos permitem testar diferentes condições de operação da mina e os impactos nas cavidades, proporcionando aos nossos clientes uma tomada de decisão mais precisa para assegurar que as cavidades não sejam sensibilizadas.

Você mencionou a integração de informações em um ambiente computacional 3D. No que consiste exatamente esse Modelo Integrado e como ele pode melhorar os resultados de um estudo?

A forma de organizar, apresentar e, por consequência, assimilar dados, pode mudar completamente nossas conclusões sobre um mesmo conjunto de informações. Assim, um trabalho importante que desenvolvemos na Tetra Tech é a composição de diversas informações, de diferentes origens e natureza, em um mesmo ambiente computacional, resultando em Modelos Integrados 3D do objeto de estudo. Por exemplo, podemos criar em um mesmo ambiente computacional um modelo tridimensional geológico, geofísico, geotécnico (que chamamos de Geo³), permitindo que nossas equipes multidisciplinares façam, em conjunto, interpretações acerca do problema estudado. Tais modelos facilitam percepções e tornam mais fáceis o estabelecimento de relações visuais e matemáticas. Nesse processo, utilizamos guias de boas práticas internacionalmente aceitas de controle de qualidade e pipelines de construção e validações de resultados.

Quais são as boas práticas adotadas na construção de modelos?

Na construção de um modelo, a integração de dados geológicos, geotécnicos e geofísicos deve ser realizada com base em critérios sólidos. Para isso, existem guias internacionais de boas práticas para construção de modelos geológicos, como o “Guidelines for the development and application of engineering geological models on projects.” (IAEG) que seguimos na Tetra Tech.

Esses guias oferecem uma abordagem abrangente, cobrindo desde o planejamento detalhado de campanhas de campo, para garantir a representatividade espacial do dado, passando por investigações complementares como sondagens, ensaios laboratoriais e levantamentos geofísicos, até o gerenciamento de incertezas do modelo resultante. Em tais guias são sugeridas práticas de fluxo de trabalho que ajudam a organizar a forma como os dados são tratados e a ordem de inclusão e verificação desses dados no modelo, para assegurar que eles sejam representativos e compatíveis entre si.

Um Modelo Integrado confiável permite que ele seja facilmente utilizado em diversos tipos de modelagens, como de run-out (fluxo de massa em escorregamento de taludes ou queda de rochas) ou modelagens sísmicas, originando resultados igualmente confiáveis.

Hoje estamos cada vez mais rodeados de diversas tecnologias que empregam Inteligência Artificial (IA). Você utiliza IA no seu trabalho?

Com certeza. Tenho a felicidade de hoje ser uma das pessoas à frente do desenvolvimento de soluções de Inteligência Artificial (IA) na Tetra Tech. Hoje em dia geramos grande quantidade de dados, em todas as áreas de conhecimento. No contexto da mineração, podemos citar sondagens diretas, ensaios geofísicos e levantamentos geotécnicos diversos, como os realizados em ensaios de laboratório. No entanto, muitas vezes esses dados são subutilizados. Por exemplo, mesmo com técnicas estatísticas avançadas, estabelecer relações entre um conjunto grande e complexo de dados pode ser desafiador. É aí que entra a IA, que também é baseada em técnicas estatísticas, mas conjugadas com algoritmos de aprendizado de máquina. Na Tetra Tech temos rotinas estabelecidas para análise de diferentes tipos de dados por meio de IA.

Nós também utilizamos IA no contexto dos Modelos Integrados 3D. Modelos geológicos tridimensionais são tradicionalmente gerados por meio de informações de furos de sondagem e levantamento de dados geológicos na superfície. Tais dados são interpolados e como resultado temos o modelo geológico. No entanto, tais modelos são uma simplificação da realidade e essa simplificação é tão maior, quanto menor forem os dados disponíveis. Se colocarmos nessa equação não somente os dados geológicos, mas também dados geofísicos de diferentes naturezas, torna-se possível refinar os modelos geológicos quando relações entre as litologias e a geofísica são estabelecidas. É na definição dessas relações que entra a IA, e o modelo geológico resultante é denominado Modelo Geológico Preditivo.

Além de sua carreira em geociências, você também é músico e teve uma passagem pela Academia da Força Aérea. Como essas experiências em áreas tão distintas contribuíram para o seu desenvolvimento profissional e pessoal?

Desde novo eu sempre gostei de me desafiar em diferentes áreas de conhecimento, sempre fui curioso e nunca acreditei que houvesse algo que eu não pudesse fazer ou aprender. Na minha juventude estabeleci um objetivo de a cada dia aprender algo novo. Com base nessa filosofia de melhora contínua, percebi que quanto mais aprendemos sobre o mundo, mais ficamos abertos a aprender. Com isso, sempre quis conhecer o máximo possível do meu entorno, dentro do tempo que tenho disponível, sempre me mantendo curioso e aproveitando novas oportunidades. Fiz cursos de fotografia, de mergulho, elétrica industrial, dentre outros. Hoje, quando me deparo com algum desafio sobre o qual não existe uma solução simples, percebo que tenho facilidade para abordá-lo sob diferentes aspectos, enxergando soluções que muitas vezes não são óbvias, justamente por conseguir conectar conhecimentos de diferentes áreas mais facilmente.

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